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“O rato de biblioteca”, “Homem velho com muletas”, “Coluna Partida” e “Pintura sobre o gesso”

“O rato de biblioteca”, “Homem velho com moletas”, “Coluna Partida” e “Pintura sobre o gesso”

“O rato de biblioteca” (sec. XIX) (Carl Schleicher, 1825-1903), “Homem velho com muletas” (1872) (Ivan Kramskoi, 1837-1887), “Coluna Partida” (1944) e “Pintura sobre o gesso” (1944) (Frida Kahlo, 1907-1954)

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Pode hoje parecer bastante absurdo, dado o facto de a tecnologia ter entrado de rompante no nosso quotidiano, o que fez com que muitas pessoas tenham a sua vida literalmente dependente do funcionamento adequado de uma qualquer máquina, que, nem sempre tenha sido assim ao longo dos muitos séculos em que a Medicina e a Humanidade foram fazendo o seu percurso paralelo nas múltiplas civilizações que têm habitado o planeta Terra. Comparar a complexidade de um “pace-maker” com desfibrilhador acoplado, de um aparelho de hemodiálise ou de ventilação domiciliária (entre muitos outros exemplos) , com os primeiros dispositivos inventados para suprirem as deficiências mais comuns dos homens, como sejam os óculos ou as muletas, não nos deve levar a deixar de reconhecer que, lá bem no fundo, existe um inquestionável paralelismo, colocando deste modo em evidência a sua óbvia utilidade, para quem deles realmente necessita.

Frida Kahlo, foi uma pintora mexicana, filha de pai germânico (alegadamente de ascendência judaica) emigrado nos fins do sec. XIX para o México, e de mãe meio indígena. Foi uma criadora artística genial, tendo tido uma vida eivada de sofrimento e de aventuras amorosas algo frustradas. Companheira e discípula do grande moralista Diego Rivera, foi amante de Leon Trotsky, e, ficou, desde criança, marcada pelas sequelas graves, num dos membros inferiores, de uma poliomielite que então contraíra. No final da adolescência, sofreu um grave acidente de viação, tendo fraturado os ossos da bacia e algumas vértebras, para além de ter tido lacerações profundas ao nível do períneo, pelo que ficou longos meses acamada dentro de uma carapaça de gesso e em grande sofrimento físico e psicológico. Posteriormente, veio a engravidar várias vezes e a ter sempre abortos após cada nova tentativa de ser mãe, tendo vindo a morrer de suposta embolia pulmonar, com apenas 47 anos de idade. Os seus patobiógrafos admitem ainda os diagnósticos de “spina bífida” e de “síndroma de anticorpos antifosfolípidos”, o que é bem plausível, atendendo aos antecedentes patológicos descritos.

O facto de esta genial artista ter tido de se sujeitar a tratamentos que exigiram uma longa imobilização forçada no leito, para consolidar as fraturas que surgiram como consequência do trágico acidente de que foi vítima, mas que era a terapêutica então mais correta, mediante os conhecimentos científicos disponíveis, criou nela aquilo que se verifica hoje em dia em muitos doentes que têm as respetivas vidas suspensas de uma grande diversidade de aparelhos cada vez mais sofisticados: uma relação ambivalente e contraditória, caracterizada por um misto de amor-ódio, de libertação-encarceramento, de felicidade-tristeza, de prazer-sofrimento, de serenidade-angústia que é necessário saber entender e, se possível, antecipar. A pintura que deixou na carapaça de gesso em que a “aprisionaram”, é um exemplo eloquente e demonstrativo disso mesmo, sobre o qual vale a pena meditar.

 

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