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“Paul Gachet” e “Flores amarelas”, “Casa de Paul Gachet”, “Van Gogh Morto”, “Células adormecidas”

“Paul Gachet” e “Flores amarelas”, “Casa de Paul Gachet”, “Van Gogh Morto”, “Células adormecidas”
“Paul Gachet” e “Flores amarelas”, “Casa de Paul Gachet”, “Van Gogh Morto”, “Células adormecidas”

“Paul Gachet” (1890) e “Flores amarelas” (1889) de Vicent van Gogh, 1853-1890, “Casa de Paul Gachet” (1873) (Paul Cézanne, 1839-1906), “Van Gogh Morto” (1890) (Paul Gachet, 1828-1909), “Células adormecidas” (Sec XX-XXI) (Susan Macfarlane, 1938-2002)

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A importância da iatrogenia para o doente, pode variar muito de caso para caso, não dependendo do teor da especialização, mas antes daquilo que é o cerne do exercício profissional, e é, por inerência, transversal a todas: a ética e a necessidade de exercer o ato médico segundo a “legis artis”. Um dos aspetos mais importantes é o da toxicidade farmacológica, designadamente da que decorre das interações dos medicamentos entre si, mas também destes com outros compostos que se encontram na alimentação ou que são tomados pelos doentes como sendo inertes, pois, como se diz vulgarmente, trata-se “apenas de produtos naturais ou de meros chás sem grande importância”. Como se não tivessem, como os outros, composição química, e não fossem posteriormente metabolizados, tal como tudo o que ingerimos. Seria muito importante que todas estas noções fossem sempre explicadas inteligivelmente aos doentes, embora, infelizmente, na realidade do dia-a-dia, tal só aconteça a uma minoria. Porque, em quase todas os casos, os doentes só têm uma deficiente noção destes factos e das potenciais consequências tão nefastas que lhes são inerentes. No entanto, o que está verdadeiramente em causa, noutras circunstâncias, é a toxicidade intrínseca do próprio medicamento, embora aqui estes sejam utilizados para o tratamento de doenças de prognóstico muito reservado.

Não sendo fácil encontrar exemplos, nos registos pictóricos, que façam parte da história da pintura e da própria medicina, será interessante, contudo, explicar a razão da escolha destes quadros. O Dr. Paul Gachet (também ele um artista plástico, como aqui se exemplifica, pois, fez o retrato de Van Gogh, quando estava no caixão, durante o seu velório), era um entusiasta e um suposto conhecedor da denominada medicina natural e homeopática. Foi médico de vários e famosos artistas dessa época, incluindo o genial Van Gogh (tendo este deixado vários retratos do mesmo, de que o que se escolheu, é apenas um exemplo). A sua casa era assiduamente frequentada pelos mesmos, tal como se pode constatar no quadro do não menos genial pintor francês, Paul Cézanne. Um dos produtos que se sabe que tinha o hábito de receitar aos seus doentes (e tê-lo-á, eventualmente, feito ao próprio Van Gogh) era um derivado de uma planta (a “digitalis”) que pode ter, como efeito acessório, a denominada “xantopsia” ou “xantocromia”, que se caracteriza pelo tingir o campo visual de um tom amarelado. Especula-se: terão os maravilhosos tons dessa cor, tão próprios de obras de Van Gogh, como podemos constatar em muitos dos seus maravilhosos quadros (como a jarra de flores, e o retrato do seu médico, aqui reproduzidos), sido fruto da sua criatividade, ou da simples ingestão deste composto, (ou de ambos???!!!), questionam os seus patobiógrafos…

O que não é mesmo fruto de nenhum tipo de especulação é o último quadro. A sua autora, Susan Macfarlane, uma apreciada pintora britânica que, acabando por falecer de acidente, na sua própria residência, tinha padecido antes de uma neoplasia da mama e de uma leucemia, dedicou uma parte importante dos últimos anos sua vida a pintar temas médicos. O quadro que aqui se apresenta tem um nome muito sugestivo (“Células adormecidas”) e foi inspirado precisamente na observação, ao microscópio, das células do seu próprio corpo. A quimioterapia utilizada em oncologia é, como se sabe, extremamente tóxica. O que nunca retirou à sua autora, a esperança e a capacidade de lutar contra o seu destino, através da arte que partilhava com os outros. Um exemplo de sobrevivência e de altruísmo, fruto de uma vida intensamente vivida.

 

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