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“O doutor”

Quadro de Luke Fields, pintor Inglês (1843-1927) de 1887

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Tudo, na natureza, é feito de ciclos, tal como aquilo que os Humanos fazem. A conceção de um livro, de ena composição musical ou de um quadro tem o seu ciclo. A vida humana, também. Nascer, crescer, envelhecer e morrer é a concretização acabada do que enunciei previamente. Os dois primeiros quadros são da autoria, respetivamente, de um pintor italiano, e de um holandês, ao passo que os dois seguintes, são fruto do génio artístico de um dos maiores pintores portugueses do século XX, (natural da ilha de São Tomé). O Homem não é eterno, dado que essa é uma característica exclusiva das divindades. Quase todos nós, um dia, ir-nos-emos confrontar com a doença, com a deficiência, com o sofrimento, e, certamente, com a morte, enquanto último capítulo da própria vida. Os vulgares cidadãos e, os médicos, também. Todos, porque a condição de sermos profissionais de saúde não nos isenta de, antes de tudo, sermos Homens como os restantes. Com tudo o que isso implica. Como tal, no relacionamento médico-doente, é imperioso que esta noção esteja sempre presente. Porque ela é condição imprescindível da humanização que nunca deverá estar ausente.

 

Mas é, sobretudo, no último quadro que me proponho deter. O seu autor, Sir Luke Fildes, uma das maiores referências da pintura britânica da era vitoriana, recebeu uma vez uma encomenda, para pintar um quadro sem um tema definido. Tal convite foi da iniciativa de Sir Henry Tate, dono de um verdadeiro império de empresas e filantropo no domínio do meio artístico (existindo em Londres duas famosas galerias públicas, com o seu nome, a “Tate Gallery” e a “Tate Modern”), em pleno alvor da primeira revolução industrial em Inglaterra. A obra foi intitulada, pelo seu autor, de “O Doutor”, representando uma homenagem que este artista pretendeu fazer ao clínico, Dr. Gustavus Murray, que tratou o seu filho mais velho, Philip, embora este tenha vindo a falecer, mesmo apesar da sua reconhecida dedicação e competência. Que melhor forma poderia assumir o elogio à sua capacidade de relacionamento humano? Certamente que a confiança que soube incutir na família enlutada, a empatia que se gerou e a compaixão que manifestou, foram os ingredientes que permitiram tal altruística atitude, mesmo apesar da dor irreparável da enorme perda. Por isso, a AMA (American Medical Association) o escolheu para lançar uma campanha, na altura, a favor da decisiva importância da personalização e da individualização na prestação dos cuidados de saúde, para esclarecimento dos doentes, em particular, e da população, em geral. A que eu acrescentaria, no fundo, para preservar a essência da profissão médica: a ética na relação médico-doente.

Tamvel tnha havido uma decisiva influência, tamvbém, para a conseção deste ícónico quadro, o facto de o ambiente que se vivia nos meios sub-urbanos das principais cidades de sua Exª, a Magestade do maior império mundial do sec. XIX, terem sido genialmente retratados nos livros de Charles Dikens, onde é possível percecionar, nas suas pungentes descrições literárias, a precaridade da vida do vulgar cidadão, também ele, à semelhança das máquina industrias que enchiam os edifícios onde se situavam as inúmeras fábricas circundantes, promovido à condição de não ser mais do que uma mera e simples peça descartável da enorme máquina produtiva que se ia erguendo vertiginosamente. Luke Fields foi, pois, um dos expoentes criativos dessa memorável época histórica, tendo ilustrado algumas das obras desse grande escritor britânico seu contemporâneo. Neste útimo quadro é assim possível visualizar, não só a extrema exiguidade das condições de hegiene da própria habitação, como o ar contemplativo de enorme sereniidade e concentração do clínico, mau grado a constatação da inevitabilidade da morte do seu paciente, bem como a presença dos pais, ele com uma ar de aparente resignação e ela em profunda e amargurada postura de reclusão emocional.

No momento em que se se pretende promover a Relação Médico Doente a Património Imaterial da Humanidade, meditar sobre a mensagem deste inolvidável quadro, é uma das melhores formas de promover esta iniciativa. É que só através desta relação é possível que, apesar dos pais verem o médico impotente prante a doença que ceifou a vida do sei amado filho, tenham tido ainda a lucidez e a grandeza de espírito para o aceitarem e reconheceem o esforço do impotente médico assistente.

Da esquerda para a direita, respetivamente, “Auto-retrato” de 1911, por Luke Fields, Pintor Inglês, 1843-1927; “Henry Tate” de 1897, por Hubert Herkomer, pintor anglo germânico, 1849-1914; “Charles Dikens” de 1859, por William Frith, pintor inglês, 1819-1902, e “Raínha Vitória” de 1900, por Bertha Muller, pintora austríaca, 1848-1937

Da esquerda para a direita, respetivamente, “Auto-retrato” de 1911, por Luke Fields, Pintor Inglês, 1843-1927; “Henry Tate” de 1897, por Hubert Herkomer, pintor anglo germânico, 1849-1914; “Charles Dikens” de 1859, por William Frith, pintor inglês, 1819-1902, e “Raínha Vitória” de 1900, por Bertha Muller, pintora austríaca, 1848-1937.

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